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sexta-feira, 25 de janeiro de 2013

Sustos do cotidiano e uma triste rotina


A página virada que representa o ano que passou ainda oscila com forte tendência para as notícias ruins. É tempo de férias, com sol e festa, tudo em um ritmo mais lento. Mas a violência permanece viva. A vocação criminosa, não cansa, é muito bem recompensada em um país de frouxos (conforme as moças do BBB 13). Mesmo assim, a maioria cultiva  planos, desenha um futuro. Esquiva-se das tentações criminosas e tenta manter sua rotina entre as obrigações e o lazer e quem sabe, se surgir a oportunidade, viver uma história de amor. É assim que a vida deve funcionar. Foi assim como Dona Ana. Mulher madura, divorciada e com dois filhos adultos, avaliava que já estava mais do que na hora de namorar. Nada de casamento! Algo mais leve, para rebater a solidão e a carência afetiva que volta e meia aparecia. Quantos não pensam nisso?

Em outubro passado, em uma visita a Feira do Livro de Porto Alegre, conheceu Alceu, um pelotense simpático e fã de Machado de Assis. Tinham histórias semelhantes, ambos descasados e ocupados demais com a família. Acabaram esquecendo-se de seus próprios projetos. Filhos com vida própria e eles a enfrentar uma desagradável sensação de vazio. Não haviam se preparado para a maturidade, ou melhor, não haviam pensado que além de cuidados médicos, é saudável cultivar um bom grupo de amigos e, se possível, alguém para dividir afeto. Assim,  se tornaram parceiros, primeiro longas conversas em cafeterias, idas a livrarias, cinemas. Estavam felizes, em sintonia.

Pouco antes do Natal, combinaram um jantar para troca de presentes. Depois disso, cada um iria dedicar-se aos filhos e netos nas festas de final de ano. Julgaram ser muito cedo para uma aproximação entre as famílias, embora todos já percebessem que a amizade fazia muito bem para os dois. Às 21h15 ela estava no restaurante. Quinze minutos depois tentou contato. Alceu não atendeu o celular. Uma hora depois, angustiada, voltou para casa. Deu-se conta de que não sabia onde ele morava. Falavam-se apenas por telefone e não participavam das redes sociais na internet. Como ele era muito pontual, temeu pelo pior.

Passou a noite em claro e, na primeira hora da manhã, recebeu uma ligação. Era um dos filhos do Alceu, a pedir desculpas por apresentar-se daquela maneira, mas o pai havia sofrido um assalto. A violência extrema dos bandidos o havia deixado desacordado por muito tempo, explicou. Ela comoveu-se ao saber que as primeiras palavras dele foram “Perdi o jantar! Alguém avise a Ana, por favor!” Aquilo lhe parecia um destes tantos filmes românticos que assistira que decidiu-se por um roteiro com final feliz. Visitou Alceu no hospital e o ajudou na recuperação. Quando o Natal chegou, estavam tão íntimos que a reunião entre as famílias aconteceu naturalmente. A violência externa os unira de tal forma que pareciam conhecer-se há muito tempo.

O cotidiano tem centenas de histórias semelhantes. Muitas, lamentavelmente, com um desfecho mais sofrido.  O certo é que as pessoas não devem entregar os pontos. Se em 2013, muitas páginas do cotidiano repetem o ano que se passou. com manchas de sangue e dor, muitas outras se abrem com a apaixonada força daqueles que não se entregam jamais. Esta é a melhor munição para enfrentar todas as adversidades que ainda virão. A cada dia, estas pequenas conquistas, motivarão políticas públicas mais rigorosas onde a lei será aplicada sem panos quentes. Está mais do que na hora de se deixar a brandura apenas aos amantes. Estes merecem.