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quarta-feira, 11 de setembro de 2013

Dias de luta, dias de glória. Porque não?

Jovens suicidas, jovens depressivos. A fase mais bonita da vida -  apesar das incertezas e medos – mas tão rica pela surpresa do novo e a possibilidade de mudança, acaba desperdiçada no desencanto depressivo. Iinacreditável em um mundo onde quase tudo pode ser diagnosticado, remediado ou mantido sob controle. Fico abatido quando vejo tantos guris e gurias a sofrerem de forma tão intensa que chegam ao absurdo de atentar contra a própria vida. No início da semana, o ex-baixista da banda Charlie Brown Jr, cometeu suicídio. Leio nos jornais que Champignon, como era conhecido, sofria muito desde a morte do parceiro de banda, o vocalista Chorão, por overdose de cocaína (outro ato suicida). Ele não soube abrir os olhos para as coisas boas que permaneciam, como as canções, os fãs, e família e esposa, grávida de cinco meses. A depressão deixa suas vítimas cegas, surdas e mudas. Cria uma capa egoísta – eu sei bem, porque muito lutei contra a depressão – onde parece que a dor do mundo se concentra em si e diante de tanta e injusta aspereza, chega ai extremo de querer a morte.

Na minha adolescência, ainda existiam alguns desses médicos da família. O tipo que valia a pena se chamar de “doutor”, que ajudava contra os males do corpo e ainda receitava sábias dicas quando a dor era na alma. Um destes profissionais, certa vez me sugeriu que toda a vez em que estivesse “pra baixo”, levantasse o moral escrevendo sobre coisas bonitas, positivas. No princípio era doloroso exaltar o sol, quando eu me sentia coberto de nuvens negras. Mas na rua o dia lindo acabava vencendo. E se fosse tempço nublado, chuvoso, me forçava a buscar a beleza que se escondia na água que rolava da calçada, lavava os paralelepípedos (que palavra imensa!) e realçava o verde das árvores, dando um ar poético, mas não melodramático ao cotidiano.

E assim, fui enfrentando as adversidades, os monstrinhos dessa tristeza que surge do nada, ou às vezes de uma situação trágica, mas que deve ser enfrentada, porque essa é a nossa missão. Acho que tanto os jovens músicos do Charlie Brown cantaram temas bacanas, que talvez tenham esquecido sua própria mensagem. Sempre gostei, por exemplo, de ouvir  “Dias de Luta, Dias de Glória” , um verdadeiro hino à resistência ao afirmar “quanto mais a gente rala, mais a gente cresce (...)  Com a cabeça erguida e mantendo a fé em Deus, O seu dia mais feliz vai ser o mesmo que o meu. A vida me ensinou a nunca desistir, Nem ganhar, nem perder mas procurar evoluir. Podem me tirar tudo que tenho, Só não podem me tirar as coisas boas que eu já fiz pra quem eu amo.”

Impressiona, não é? Então, sejamos aqueles que enfrentam todas as batalhas, que não são poucas, para vivermos também dias de gloria. Vamos além da nossa imagem no espelho, onde aquele “eu” que busca sempre o entendimento, não vai sucumbir diante das maldades alheias, dos pensamentos turvos, dos contrapés que aplicamos em nós mesmos. Se a dor é química, tem remédio, para tratar. Se a dor é do espírito, tem sempre alguém para te escutar.

E tirar lá do fundo, com total entrega, mesmo nas manhãs frias que antecipam à luta, a canção do Charlie Brown que concluía sabiamente: “Hoje estou feliz, acordei com o pé direito. E vou fazer de novo, vou fazer muito bem feito!” Isso vale para até para os jovens como eu, que já acumulam mais de meio século. Dias de boa luta para todos!

quinta-feira, 5 de setembro de 2013

O véu que cobria a noiva

E lá estava o velho eucalipto no Parque da Redenção, em Porto Alegre. Imponente, majestoso, até desabar sobre três pessoas que faziam sua caminhada habitual, ou simplesmente curtiam o verde que resiste ao concreto da cidade grande. Não vou aqui iniciar um tratado sobre a podridão que o devorava por dentro, não sou botânico. Mas a metáfora das aparências é irresistível. As cenas que assistimos no cotidiano onde as estampas – macias, bonitas e fofas – muitas vezes se consomem em uma feiura e aspereza interior que pode levar a grandes e surpreendentes tombos.

Apaixonado por fotografia, muitas vezes registrei eventos, casamentos, batizados e festas de amigos. Na maioria das vezes era contratado para trabalhos diferenciados, utilizando filmes e filtros, em cenas inusitadas. Hoje é comum, esse tipo de coisa, mas nos anos 70 eu conseguia um dinheiro extra e ainda me divertia. Ou tomava sustos. Foi mais ou menos assim, na vez em que fotografei uma noiva linda, morena de olhos verdes. Guria muito séria, frequentadora de Igreja. Ela e o noivo.

Tão envolvida estava com a idéia de fotografar o cotidiano, das aulas na faculdade até o curso de noivos que, numa dessas sessões fotográficas esqueceu que eu estava ali para registrar tudo. Minutos depois da foto em uma antiga loja de discos da Capital - um beijo tipo “selinho” no noivo, este sempre com pressa para voltar ao escritório, beijou apaixonadamente um cara que eu não conhecia, em plena Rua da Praia. Quando ela se deu conta que eu estava ali e havia registrado tudo, implorou: “Ele é só um antigo amigo. Foi uma brincadeira”, jurou.

É claro que joguei fora os negativos que a incriminariam. E ainda por cima, no dia do casamento, caprichei em outras fotos alternativas não comprometedoras onde o véu branco, símbolo de virginal pureza, contrastava com um sorriso enigmático. Soube que a relação durou exatamente um ano. O marido não precisou de minhas fotos para descobrir o óbvio. A árvore que haviam plantado crescia bonita, mas por dentro, a hipocrisia envenenava as boas intenções e não permitia dar corpo e força às raízes. Tornava-se casca e folhas... Nem precisou de vento para cair.

Certa vez, ao ler Adam Phillips, um psicanalista inglês, lembro que ele dizia que exigir monogamia aos casais era mais do que uma mentira, uma pressão para um a ser tudo para o outro. “É uma demanda moral irrealista”, ponderava. Mas igualmente alertava que as pessoas não estão preparadas para a infidelidade. Que sinuca, hein? Em síntese, todos querem ser felizes. E para isso escolhem casamentos e profissões, muitas vezes só pela projeção social a ser desfrutada. As aparências! E o próprio psicanalista aconselhava: “Há coisas muito mais importantes do que a felicidade: justiça, generosidade, gentileza.” Virtudes que, somadas, ajudam a manter a árvore da vida frondosa por muitos anos, com certeza.