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segunda-feira, 3 de novembro de 2014

Romântico, eu?


Meu bem entenda, nosso problema é semântico.
Na verdade, eu não sou aquilo que idealizas.
O par perfeito, um ser etéreo, romântico.
Desista de mim se é disso que precisas.

À noite me encontrarás abraçado a lua.
Ou entre estrelas a medir o infinito...
Pobre tolo, dirás antes que meu verso conclua.

Imagina! Mensurar o imensurável!
Mas não será tua, a alma romântica?
Enquanto eu, patético, em esforço admirável
Tento empiricamente compreender física quântica.

Beijar é química pura. É a mistura homogênea de sais
Beijar eriça, tira um corpo da inércia!
Viu? Voltamos à física, apesar dos suspiros e dos ais.
Confundir com romance - me perdoe a rima - é solércia

quinta-feira, 30 de outubro de 2014

Mulher quatro rodas

Elas são iguais aos carros?
Rodolfo Rodrigues, bancário e aficionado por automóveis, volta e meia me envia e-mails com dicas de camionetes tracionadas, pois insiste que eu, vivendo em um sítio, preciso destes modelos e não de carros macios, feitos para o asfalto. De quebra, me conta relatos de suas conquistas amorosas. Ele, como todo bom machista, se diz especialista em mulheres. É do tipo de paixões intensas, diz ter aprendido tudo sobre elas ao idealizar uma perfil do universo feminino a partir dos carros. "Avaliar uma mulher é muito semelhante a um automóvel", garante. Então, os irmãos Meneghini, sócios na loja onde meu amigo Gilba Jasper, compra todos seus carros, em Arroio do Meio, em outras palavras, seriam mestres no assunto?

Por exemplo, a atual namorada do Rodolfo, está em fase de teste drive. "Não é zero, mas tem aquele perfume típico do estofamento de couro novo", afirma entusiasmado. Boa de suspensão resiste bem a ao tranco. Sempre fez as revisões periódicas em autorizadas. Saúde é fundamental, acredita. Igual a um auto de luxo, a mulher ideal precisa ser de condução leve e macia. Caso contrário, é como comprar um carro sem ar-condicionado e direção hidráulica ou eletrônica.

"Esse negócio de não usar batom, não cuidar das unhas, não depilar-se é como descuidar da manutenção do carro. Não precisa ser mulher-perua, pode ser uma mulher-sedan, ou mesmo, mulher-off-road, com todo o conforto que a vaidade exige". Air bag? Rodolfo ri de minha provocação. Air bag é acessório obrigatório. Não precisa ser original de fábrica. Adaptações posteriores com silicone de boa qualidade, são aceitas.

"Não quero uma mulher-objeto, igual a um veículo de quatro rodas. Seria machismo demais", reconhece. "Mas não admito que só ela determine como se dirigirá a relação". Tento argumentar que um carro é apenas uma máquina. Uma mulher só pode ser comparada a um sonho. Mesmo que um dia, cheguemos a conclusão de que essa mulher é uma utopia. "Eu sei, estás falando dos protótipos das feiras internacionais de automóveis", argumenta.

A "máquina" atual do Rodolfo, digamos assim, chegou com o sistema propulsor amaciado, apesar dos maus tratos do antigo “proprietário”. Rodolfo passou a trocar o óleo com mais freqüência, a lubrificar as partes que sofrem mais desgaste e exigem cuidados e extrema delicadeza", me afirma com gestos de experiente piloto. Destaca a suspensão firme, embora macia. Coxas grossas semelhantes a pneus radiais de alta aderência, que absorvem bem o impacto e não derrapam mesmo sofrendo os mais variados impactos.

O problema é que um semi-novo tem garantia curta. E quanto mais acessórios, maior o custo de manutenção. Acrescente-se niso, as reformas estéticas. O típico estica ali, puxa aqui das mulheres. Manchas na pele, rugas em locais que você nem percebe mas que, para elas, aparentam chagas a desvalorizá-las em um mercado competitivo. Há sempre um modelo novo no mercado. E quando começa a consumir mais em óleos lubrificantes? Um dia estão bem, noutros péssimas, só fazem contato no tranco "E nestes casos elas te acusam de insensível, brutamontes!" reclama.

Os carros eletrônicos, tem CPUs a provocar misteriosos defeitos, e  especialistas caros que pouco ou nada resolvem. "É a mesma coisa com as mulheres. As vezes tornam-se esquivas, desanimadas. Reclamam de tudo, não querem sair, ficam na garagem, digo no quarto, recolhidas de farol baixo, sinalizando depressão. Aliás, nestes casos, os carros tem uma vantagem. Não existe TPM veicular!  Mas o pior de tudo, são aos "mulheres-ônibus onde sempre cabe mais um." Quando eu disse que a comparação com transporte coletivo era um exagero desrespeitoso ele ironizou.

"Arrepiou? Quer bancar o politicamente correto? Estás assim porque só tens andado em máquinas fora de linha ou com marias-gasolina. Aliás, veículos e mulheres tem um custo alto demais se calcularmos o tempo a ser desfrutado em seu interior.", conclui às gargalhadas. Encerrei o bate-papo ali mesmo.

terça-feira, 16 de setembro de 2014

Os que sofrem mais

Algumas pessoas têm a especial habilidade de valorizar dramas pessoais além da conta. Acompanhei nas redes sociais uma conversa digitada neste rumo. Era tal de “ninguém me entende, só acontece comigo e o que eu fiz para merecer isso” que chegava a enojar a quem curtia, ou descurtia, o bate-papo online. A mulher reclamava que o marido adquirira uma bactéria ultra resistente. “Tu nem sabe, gastamos uma fortuna, ele emagreceu, desconfiei até de doença sexualmente transmissível. Justo ele, que mal dá conta em casa”, detonou a esposa.

E navegando na autopiedade dizia que em uma outra vida devia ter sido uma pecadora insana para sofrer tanto! A lista de infortúnios cotidianos era interminável: falta de remédios, filas intermináveis para consultas com especialistas milionários, como se fosse a única a viver tais desconfortos. A todo comentário solidário que recebia, respondia com relatos escabrosos, ou nem tanto, de seu dia a dia à beira do leito hospitalar.

Isso foi até uma de suas amigas perguntar, talvez irritada com essa mania de se tornar “a maior vítima do mundo”, sobre o verdadeiro estado do esposo já que ela estava podendo acessar a internet. E a lamurienta precisou reconhecer que, finalmente, haviam encontrado uma medicação eficiente e o organismo do infeliz reagia positivamente. Até uns quilinhos ganhara. Graças a Deus! “Viu? Nem tudo é problema em tua vida. Com fé sempre se encontra uma solução”, disse a amiga otimista.

E mesmo alertando que não gostava de colocar temas tristes nas redes sociais, essa mesma amiga confidenciou ao grupo um drama pessoal bem recente. “Vocês sabem que desde a morte de meu marido, nunca mais tive outro relacionamento.” Mas no ano passado, conhecera “um senhor muito simpático”, em uma excursão ao Nordeste. E da conversa descompromissada, iniciou uma amizade mais íntima. Um namoro discreto como o de muita gente madura, que já não acreditava mais nisso. Em poucos meses eram parceiros em cinemas, jantares e viagens.

Não escondiam nada, mas também não revelavam a relação para os outros. Isso durou até o dia em que, repentinamente, perderam contato. Ela ligou várias vezes e nada! Foi até ao apartamento dele e o zelador repetiu o que ela já sabia: estava em visita a filha, em Belo Horizonte. Mas por que não atendia? Ou ligara como haviam combinado? Na semana passada, veio a resposta. A filha, pedindo desculpas por não retornar as ligações. O celular fora localizado, totalmente desmontado, debaixo da cama.

Relatou, entre lágrimas, que o pai sofrera um infarto fulminante. “Quer notícia mais dura e triste? Tu tens ainda teu marido e, eu, de alguma maneira, voltei a ser viúva”. A outra, fatalista como sempre, manifestou seu pesar, é claro. Mas contra-atacou:

“Pelo menos tu não viveu a angústia que ainda enfrento. E se o tratamento não der certo?” A conversa acabou ali mesmo. A dor maior sempre será do egoísta que se faz de vítima. Tenho certeza que meus caros leitores já cruzaram com gente assim. Ou serei eu o único?

sexta-feira, 5 de setembro de 2014

O fast-food do Universo

O governo do Peru declarou como patrimônio cultural da nação os conhecimentos tradicionais e usos da ayahuasca praticados por comunidades nativas em sua floresta amazônica. Aqui no Brasil, a planta é conhecida como  "Santo Daime" e entidades como o Alto Santo, Barquinha e União do Vegetal, solicitam o reconhecimento do governo para seu uso em rituais religiosos, como patrimônio imaterial da cultura brasileira.

Os peruanos justificam a iniciativa ao destacar que a capacidade psicotrópica da planta atua sobre o psiquismo, a atividade mental, o comportamento, a percepção, sendo conhecida no mundo todo como uma planta indígena que transmite sabedoria para os iniciados sobre os próprios fundamentos do mundo. Quem me enviou essa notícia foi um antigo parceiro dos anos 60 ao lembrar os tempos dos hippies, quando muitos buscavam essências divinas entre alucinógenos e meditação transcendental. Entre outros, o livro "Uma Estranha Realidade", do mexicano Carlos Castaneda é um bom exemplo.

Na época, meu amigo, achava tudo isso uma grande bobagem. No mínimo uma desculpa para drogar-se. Hoje, diante da violência, do pragmatismo exacerbado que destrói o núcleo familiar e torna a existência uma encruzilhada de compromissos materiais e questionáveis conquistas revolucionárias, passou a acredita que, ao buscar respostas interiores e dar um tempo para pensar a vida, tudo ganha mais sentido.

Morremos assassinados por meninos sem fé, bandidos sem limite e policiais sem razão. Um mergulho na experiência ancestral de quem tão bem se relacionava com a natureza, não ajudaria um pouco? Respeito os que utilizam a ayahuasca como religião. Mas ainda acho que a prática da  meditação, seja através de yoga ou outro método ainda é um caminho mais limpo. Evita a poluição química do organismo, te obriga a um verdadeira abrir de portas.

De qualquer forma, algo precisa ser feito imediatamente. É preocupação demais com  dinheiro, cartões magnéticos e carro novo. E o sexo? Queremos o melhor, o maior, o mais sarado, ou o mais excitante sempre e a qualquer hora. Trocamos a naturalidade das coisas, por fotos maquiadas em revistas, espetáculos onde vale tudo e tudo passa a valer nada. Não é esse o caminho do prazer e amor.

Aquele que pretende  emagrecer deve, antes de tudo, retirar as "gorduras" que oprimem a constatação de que somos o fast food do Universo. É tão curta nossa passagem que precisamos temperar a vida com as finas ervas da fé, da sabedoria que nada tem a ver com o conhecimento tecnológico mas que se somada a este, lhe dá mais sentido. E sentido é tudo o que buscamos.

Está certo o governo peruano ao reconhecer uma tradição popular. A valoriza de tal forma que a impede de acabar como produto nocivo que simplesmente aumentaria o vazio da alma humana. Assim como aconteceu com outra planta de origem indígena - a coca -, que ao ser processada pelo colonizador oportunista, transformou-se em uma das mais mortíferas desgraças da sociedade moderna.

quarta-feira, 20 de agosto de 2014

Votar é preciso!

Na semana passada, por pouco não ultrapassei o acesso da Rodovia do Parque, no sentido Vale dos Sinos a Porto Alegre. É claro que assim como todo mundo, saí esbravejando c0ntra a falta de sinalização. Afinal do que adianta o mega asfalto se não nos orientam como acessá-lo? Foi aí que minha esposa apontou a imensa placa, com seta e velocidade limite indicadas. Tudo perfeito, não fosse a pichação com riscos, palavras obscenas e desconexas que a encobriam totalmente. Este é apenas um detalhe no grande circo que tantas vezes se arma em nosso país. Todos contra o universo político e administrações públicas. E a contribuição de cada um para melhorar o que está ruim.

Com certeza não foi um parlamentar sem noção quem destruiu a sinalização. Talvez tenha sido um sujeito que a toda hora, critica os políticos. É fácil reclamar da corrupção, dos desmandos, dos candidatos despreparados e da falta de ação nas esferas governamentais. Queremos estudo, queremos leis, queremos mais! Queremos que se cumpram as leis! Queremos tudo, enfim, mas não nos autorizamos a cuidar nosso próprio rabo preso a uma placa destruída de trânsito.

Vejo militantes de todas as áreas, muitas vezes, constrangidos ao entregarem panfletos. Divulgar as propostas de seus candidatos é quase um pecado na guerra santa que desmerece, indiscriminadamente, o esforço de tantos nas cidades, estados e nação. Serão todos assim? Não simplifiquemos, não anulemos votos em nome de um protesto que, a meu ver, é uma promissória em favor dos que lucram com a miséria, com a ignorância, com a própria falta de seriedade de alguns maus políticos.

Talvez as pessoas queiram soluções encantadas, anjos celestiais e trombeteiros divinos. Reclamam das propostas, da mesmice apresentada em ralos minutos nos meios de comunicação. Querem originalidade, mas em seus cotidianos, o que fazem para tornar a vida melhor, menos repetitiva? Quando são chamados na escola porque o filho aprontou, por exemplo, desabam em ira contra os mestres, na defesa irracional dos rebentos.Praticam pequenos delitos, receptam fios de cobre que escurecem vias urbanas sustentadas com nosso caro imposto! Cínicos! Usam o carro da firma para assuntos pessoais, e se as taxas são muitas, sonegam. Pagar o imposto e cobrar sua aplicação correta, seria bem mais ético.

É fundamental ler as propostas que, afinal, representam o nosso futuro. Candidato não brota em  árvore. É um sujeito igual a nós, que bota a cara a bater por gostar de política. E se ele entrou nessa para se locupletar, na próxima votação, o povo que é atento, o pune nas urnas. Nem precisa quebrar prédio público, conspirar nas redes sociais. Mas alguém ai fiscaliza? Lembra em quem votou na eleição anterior? Que feio! Anotemos tudo, então. Vamos exigir, sugerir, dar trabalho aos marqueteiros. Faz-de-conta não enche barriga! Emocionante é escolher a proposta que brotou com sua participação e ainda ajudará muitos outros.

Está na hora de limpar a política do conchavo espúrio, do interesse exclusivamente pessoal. Pensar no coletivo faz o individuo andar melhor, mais seguro, dono de seu nariz. Não desligue o rádio, anote e se faltou criatividade, sugira algo melhor. Ponha a cabeça a funcionar. Porque o maior mal está à espreita dos que se omitem. Fique atento: alguns tem um título eleitoral em uma das mãos e uma arma na outra.  Nós que ocupamos as mãos, com o trabalho que carrega o país, levemos o título eleitoral  no bolso esquerdo do peito.

E transformemos esse documento na arma que dispara saúde, cultura, segurança e oportunidades. Aquilo tudo que prometem mas que apenas nós, eleitores, gente do povo, pode fazer cumprir, se usar corretamente a urna eleitoral. Portanto, atenção ao horário gratuito, que não tem nada de gratuito e pode custar caro aos que se omitem. Dê essa chance a você mesmo, se antes não funcionou, faça um mea culpa, vote outra vez. Mas nunca,  jamais, se omita.

quarta-feira, 13 de agosto de 2014

Para Robin Willians, com carinho

A fortuna, a fama e a glória,  não foram suficientes para o talentoso Robin Willians, ator norte-americano que, em profunda depressão, acabou com a própria vida. Personagem de tantos filmes bacanas – Bom dia, Vietnã!, A Sociedade dos Poetas Mortos – só para citar aqueles que mais me agradaram, não segurou o grande personagem que representava para todos nós: do homem realizado, que faz o que mais lhe dá prazer, que alimenta a alma com a energia do próprio talento e o recicla entre milhares de fãs. Mas a tristeza quando escapa os limites da alma, transformando-se em distúrbio químico, é um perigo!

Seguidamente sou citado entre amigos e colegas de trabalho, como um sujeito equilibrado e tranqüilo. Eu, daqui do vulcão que não permito jamais entrar em erupção, me ponho a rir. Assim como tantos outros talvez tenha como maior virtude, a capacidade de manter as lavas da insatisfação, sempre distantes da depressão. Busco, lá no fundo, o que realmente sou e o que represento para os outros.

Assumir-se como centro da humanidade é uma espécie de escapismo originado, quem sabe, em limitações impostas por uma infância sofrida, dramas mal resolvidos, frustrações diversas. Sempre que me senti um zero à esquerda, procurei olhar o que convulsionava meus interiores e, com brutal esforço, é claro, dava um jeito de resolver a pendenga e me perceber muito maior, e melhor, do que qualquer drama existencial.

Assumir a limitada condição humana implica em aceitar erros - nossos e de terceiros – e cá entre nós, isso dá um certo alivio. Tira a corda – ou cinto – do pescoço. Desarma o espírito e sei, ajuda a dividir a dor com os outros, sem parecer um chato a reclamar de tudo e todos. Tem gente que passa metade da vida entre queixumes de falta de reconhecimento de amigos, de familiares, de amantes, de eleitores e candidatos. Quase morrem desgostosos. Mas nunca conferem como anda a estima. Gostar-se, um pouquinho que seja, faz bem.

Afinal, como dizia John Lennon, “Podes viver uma mentira até o fim, mas uma coisa jamais conseguirás esconder o tempo todo: é quando estás esmagado por dentro”. Vivamos então,  a nossa dor, como se o dia  de amanhã estivesse confirmadíssimo com sol e céu azul. Mas se por ventura chover, que seja uma benção a irrigar a esperança, confirmando que somos todos tão originais, tão únicos, que merecemos – e devemos -  inspirar com o nosso melhor, aqueles que circulam - temerariamente - entre os limites da razão.

quinta-feira, 31 de julho de 2014

A felicidade pedalada

A felicidade passeia em uma bicicleta de pneus gastos e aros desalinhados. Mas está lá, risonha, firme no velho selim de molas que range a cada solavanco. É tudo uma questão de equilíbrio, mas cair, esfolar-se, faz parte. Sempre haverá alguém a estender a mão. Nas esquinas, nas ruas movimentadas, a felicidade quase sufoca ao circular entre gente em quatro rodas e trilhas para todo tipo de ir e vir,  menos o dos que pretendem conduzir a existência com um mínimo de cuidado e atenção à paisagem.

Um bom ciclista não se deixa abater. Encara a subida mais íngreme e, na descida, vai atento aos freios para não despencar perigosamente. Às vezes a natureza torna tudo ainda mais arriscado, quase impossível. Muita chuva, muito vento, muita tempestade. E a tal felicidade passa a andar a pé, descalça no solo hostil, ou na carona dos que trocam a luta, o sorriso sempre reconfortante por compromissos falsamente urgentes e que nunca miram as consequências.

Quem se atreve a garantir que felicidade troca sua bike por uma vida em palácios, confunde riqueza com nobreza. Esta, raramente está na pompa de circunstâncias torpes, tão frequentes em  grandes impérios. Estes, encastelados em suas cortes, minguam na solidão de seu ilusório poder. Por isso, a felicidade prefere a simplicidade, jamais a simplificação megalômana.

É preciso estar sempre pronto para longas e penosas pedaladas. Buscar o dia perfeito no interior daquela manhã iniciada às avessas. Deu tudo errado? O tombo foi grande e entortou os raios das rodas? Saiba que os desencontros, as intempéries mais devastadoras sempre serão mais breves do que os tempos de céu claro e brisa leve. As peças quebradas substituímos, a felicidade também brota na reconstrução.

Ficar sentado à beira do caminho, como cantava Erasmo Carlos é que não resolve. “Olho pra mim mesmo, me procuro, e não encontro nada. Sou um pobre resto de esperança à beira de uma estrada”, choram os versos, salvos pelo refrão: “preciso acabar logo com isso. Preciso lembrar que eu existo”.

O argentino Fito Paez seguiu a mesma metáfora: “gosto de estar ao lado do caminho, Tragando a fumaça enquanto tudo passa. Eu gosto de abrir os olhos e estar vivo, ter de me entender com a ressaca (...) “viver atormentado de sentido, esta sim, é a parte mais pesada”. Por favor, não vivamos atormentados de sentido.Façamos tudo ter um foco, uma direção.

Aos que se veem diante de um precipício, por favor!  A vista é sempre assustadoramente bela diante do penhasco. Aproveite-a para enxergar longe, além das frustrações e perceber, lá na planície, a trilha que leva a um novo destino. Quem disse que não se pode traçar o próprio destino? O cansaço, a dor  e o medo serão apenas percalços desviados em pedaladas firmes. E a rotina, a partir daí, será não ter rotina.

segunda-feira, 19 de maio de 2014

A dieta da mente

Farinhas do mesmo saco: branca ou integral te fazem mal 
Todos sabem que a gastronomia é muito mais do que um hobby para mim. Leio tudo, sobre alimentos. Assim, não resisti ao tema proposto pelo médico norte-americano David Perlmutter em seu livro, “A Dieta da Mente”, recentemente lançado no Brasil pela Companhia das Letras. Sem meias palavras, ele afirma que os carboidratos podem destruir o cérebro humano. Não importa se é farinha branca, ou integral - rica em fibras, sais minerais e vitaminas. O médico e  pesquisador garante que o efeito é igualmente devastador: epilepsia, ansiedade, enxaquecas, depressão e redução da libido, estão na imensa lista de problemas provocados, segundo ele, pela ingestão de farináceos.

Em outras palavras, o livro promete provar que não são apenas fatores genéticos os responsáveis por danos ao cérebro, mas tudo aquilo que ingerimos. Para isso, apresenta relatos e entrevistas com a transformação de pessoas que estariam na trilha da demência e recuperaram - aleluia! - a saúde mental, por meio de uma dieta rica em “gorduras boas” que, segundo ele, facilitam o emagrecimento sem que se perca a cabeça.

Ele criou um programa de quatro semanas para garantir um “cérebro saudável, vibrante e aguçado - sem medicamentos”. A publicação inclui uma lista de receitas e metas fáceis de cumprir mesmo para os abobados da farinha. “O plano de ação de Perlmutter prova que você pode assumir o controle de seus genes, recuperarem o bem-estar e manter a saúde e a vitalidade por toda a vida”, diz um release da editora.

Assim, lá vai mais uma publicação entre muitas contestadas, em sua efetividade – voltada aos gordinhos - grupo ao qual me incluo. Somos refratários a movimentos radicais  pelo emagrecimento. A nossa rotina é iniciar dietas que nos expiem a culpa e raramente concluí-las. Afinal, mesmo acima do peso, conseguimos trabalhar. Tampouco nos falta amor, afinal sempre podemos conquistar alguém, literalmente, pela barriga.

As publicações, dicas e dietas milagrosas se repetem quase que diariamente. Recentemente foi o fenômeno da dieta Dukan. Nos anos 80, eu lembro do médico João Uchoa e seu best-seller “Só é gordo quem quer”. Agora surge essa, que ameaça: além de gordo, posso estar me idiotizando a base de carboidratos.

De qualquer maneira, aprendi que a melhor receita é aquela que não te proíbe nada, mas reduz quantidades a níveis que afastem os perigos da gula. Em boca fechada não entra o alimento que aumenta o peso e reduz o QI. O segredo de toda a dieta, se chama equilíbrio. O problema é que para atingi-lo, eu pelo menos, ainda não consegui uma boa receita.

sexta-feira, 9 de maio de 2014

Fralda roubada

Um pacote de fralda por uma reputação
Quantas vezes você desligou, ou trocou de canal na hora do noticiário? Ou pior, assistiu impassível ao desfile de brutalidades gratuitas que se repetem em nosso país? É uma repetição onde apenas se trocam as vítimas, porque o conceito do crime – desde o simples furto, até a corrupção e o desamor que destrói famílias – se torna mais evidente, assustador. Talvez até por isso mesmo, seja este o melhor momento para um banho moralizador e nunca moralista, em uma sociedade que agoniza entre o frio do concreto e o sangue de tantas vítimas. Queremos mais do que o simples existir, merecemos uma vida que tenha um sentido mais amplo do que esta modernidade de tantas tecnologias novas a brotar em uma sociedade sem ética.

Na semana passada eu vi, ninguém me contou, uma jovem grávida pegar um pacote de fraldas descartáveis no supermercado e surrupiá-la para a sua bolsa. Esses pequenos furtos, essas distrações éticas, ao se tornarem rotina, cobrem tudo no frágil glacê da desculpa pobre: “Não vai fazer falta, afinal eles são poderosos”, e lá vai ela, com seus conceitos simplistas, levando na barriga um ser que deveria, em tese, educar e dar exemplo, para uma vida exemplar. Quem sabe essa futura mamãe recrimine duramente os desvios em verbas públicas, reclame do celular que promete ser 4G e não completa a mais básica ligação. “Em que mundo nascerá meu filho?” Esquece que o ladrão não se reconhece pelo tamanho do furto.

Segundo psicanalistas, fatores como a hereditariedade, experiências a partir da primeira infância e o ambiente familiar, determinam a formação de uma criança que, ao sair da fase inicial do egocentrismo, onde tudo gira em torno de seu lindo umbigo, precisa da presença dos pais para ensinar coisas básicas, como ser nada legal tomar para si, objetos alheios.

Como controlar esses impulsos, se a mão que embalou o berço é mesma que não tem escrúpulos para pequenos delitos? Se a criança, inicialmente nada sente ao se apropriar do que não lhe pertence, a reação dos pais é fundamental, para demonstrar o quanto pode magoar terceiros. Sem excessos, para não traumatizar, mas com exemplos tirados da experiência própria de vida.

Que a família crie suas próprias fábulas, onde a dignidade não seja algo elástico e adaptável às ocasiões que fazem o ladrão. E que um mínimo senso ético, não desapareça, vergonhosamente, em uma fralda de bebê furtada às pressas. Isso é muito feio. E nocivo.