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quarta-feira, 16 de agosto de 2017

Marido dez porcento

Cansada do marido farrista, a indignada esposa o expulsou de casa. Não bastava a crise que lhe roubava clientes na loja e ainda tinha que aturar as escapadas conjugais. As amigas a recriminaram. Ele era trabalhador, simpático e boa pinta, embora volta e meia sumisse. Era um carteado em lugar ermo, pescarias em açudes de sereias e um celular repleto de números e ligações estranhas em horários incômodos.

Na meia idade, filhos criados, não precisava aturar um gato fujão. O único felino naquele seu espaço teria quatro patas peludas.Referia-se a Charles, um siamês de personalidade forte, por coincidência, presente do marido que, aliás, não se conformou com a expulsão. Queria a milésima chance. Mas resistiu bravamente ao assédio de flores e ligações chorosas. Ela jurou que também iria cair na noite, com as amigas. 

Mas bastava ouvir o refrão "...A terceira música nem acabou. Eu já to lembrando da gente fazendo amor. Celular na mão, mas ele não ta tocando..." e os dez porcento aumentavam na conta da saudade. No meio de tudo isso, até o siamês sumiu. Chovia muito, ventava demais e o gato não retornou como em outras vezes. Mais um macho a lhe decepcionar. Charles, pelo menos, era solteiro e independente, como todo bom siamês, consolou-se. Uma semana depois, apareceu o marido confessando o “seqüestro” do gato. 

Só o devolveria se o aceitasse de volta. Jurava ter amadurecido. Argumentou que era igual aos gatos que gostam de passar a noite na rua, e sempre retornam querendo carinho. Ou seja, se as mulheres amam os bichanos, devem compreender também os homens, que têm as mesmas características. A infeliz comparação provocou gargalhadas na esposa. 

O bom humor, mesmo nas horas difíceis, era o que mais a agradava nele. A noite tinha sido pavorosa. Chuva e vento, os bares vazios de quem lhe atraísse. Também sentia falta do "cretino sem-vergonha". Abriu a porta e entraram felizes, o homem e o bichano.  Mas alertou, com olhos de gata arisca:" Só castração para acalmar um gato fujão e virar um dócil amiguinho. Então, o mesmo vale aos homens fujões."

 "Não brinca assim...", gemeu o marido com ar sofrido. Ela falava sério. No dia seguinte, o bichano foi castrado. Acabaram-se as noitadas de cio. O outro gato, impactado, acalmou-se. Teve "castrados" o celular, que ganhou um novo número, e, pior de tudo, senha compartilhada. As festas, ou pescarias, ela acompanha. Ou ficam em casa assistindo filmes. Não sei se um marido fujão tem cura, mas por enquanto ela economiza os 10 porcento. 

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