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terça-feira, 2 de abril de 2013

April Fool's



Catherine Deneuve e Jack Lemmon: April Fool's (1969)
  "...Prá quê, que você foi se entregar
Se na verdade eu só queria Uma aventura
Porque você não pára de sonhar
É um desejo e nada mais...” (Prêntice, Ed Wilson, Paulo Sérgio Valle) canta, José Augusto

É sempre assim, O começo é divertido, cheio de provocações. Depois percebem que a atração vai além dos gracejos bem humorados, desejam o toque macio. Epidérmico. De repente, tudo em volta que andava meio opaco, ganha luz, vida e aromas especiais. O sentimento bruto, que nasce de uma súbita disposição para a aventura, ocupa todos os espaços. Esquecem que são casados, noivos ou namorados há uma longa data.

A rotina passa a ganhar um sentido e o desejo, irrefreável, avança. Tanta fantasia, tanta lua cheia, tanta vontade de celebrar. Acordos se firmam secretamente, são uivos contidos entre ligações secretas, mensagens cifradas em redes sociais e encontros rápidos, tensos. Excitantes. Assinam documentos em branco, como se o prazer não cobrasse seu preço em entrelinhas nunca percebidas diante da nudez aos olhos..

Ambos têm sede e fome, vivem no deserto do tédio comum aos adultos bem sucedidos. Não pense que os ditos infelizes, casais maltratados pela vida sofrida, miserável em todos os sentidos são as maiores vítimas das tentações. Esses quando podem, libertam-se. Gente organizada, que mantém as contas em dia, toma remédio na hora certa, cuida da balança e faz dieta, frequenta academia é a que mais cansa desta coisa certinha. A satisfação vai além do previsível. Não é um contrato, um negócio. Na verdade, tem requisitos de fundamento inexato.

Quem nunca ficou compadecido da esposa dedicada que chega a casa extenuada e ainda prepara um assado especial? Quem sabe não estará ela cansada desta vida certinha? Do homem que nunca esquece uma data especial, que planeja viagens românticas a dois, festas legais entre amigos, mas ao mesmo tempo, é  absolutamente previsível. E ficam ambos iguais a copeiros que tem a obrigação de polir os cristais que nunca serão seus, mas que se quebrados, pagarão caro por cacos. Quem vai  querer em casa, os restos do que antes era um lindo enfeite?

Assim, ao surgir a possibilidade de uma fuga espontânea, que ventile a imaginação e os sentidos, abusam de tudo, lambuzam-se e nem percebem que o acordo firmado anteriormente - viver exclusivamente uma aventura - foi rasgado na refrega que os empurrava de encontro a cristaleira.

O prazer - para um dos amantes - sempre acaba antes e aquela sintonia inicial,  vira uma espécie de coceira alérgica, pois a outra parte já fantasiava a possibilidade de uma  comunhão de corpo e alma. Assim, embora a esposa  chegue na hora certa e nunca se permita queimar o assado, aumenta o risco de uma lágrima furtiva salgar a janta. O outro – ele ou ela – já estará na segurança do lar, planejando as férias de inverno, enquanto serve, ou é servido, de mais uma fatia daquele mesmo assado.

Quem sabe, voltem a buscar uma nova aventura, “desta vez sem envolvimento afetivo, mesmo!” O outuno e frio passarão, a primavera com seus perfumes e cores, apagará as lembranças tristes e o verão, sempre permissivo, incentivará a paixão. Afinal, tudo não se resumiria mesmo a um desejo e nada mais, como previa a canção? Ah!... Os bobos de abril.

2 comentários:

Léa Aragón disse...

A vida faz coisas estranhas com a gente. Tem uma época em que a gente traz tudo mais à flor da pele, depois viram apenas lembranças, divertidas, nem tanto, mas lembranças. De repente, um artigo como este reacende uma vontade enorme de volver a los 17... Ah, Arizinho, esta tua alma feminina e este teu texto fluído e gostoso pode causar um rebuliço na alma das pessoas que já beiram os 70.

Nadir Jardim disse...

Adorei .... " E ficam os dois iguais a copeiros que tem a obrigação de polir os cristais que nunca serão seus, mas que se por ventura forem quebrados, pagarão caro por cacos. Quem vai querer em casa, os restos do que antes era um lindo enfeite?"..... [...] "Assim, ao surgir a possibilidade de uma fuga espontânea, que ventile a imaginação e os sentidos, abusam de tudo, lambuzam-se e nem percebem que o acordo firmado anteriormente - viver exclusivamente uma aventura - foi rasgado na refrega que os empurrava de encontro a cristaleira."

Bárbaro, tudo! Parabéns!!!!!!!!!!!!!!