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sábado, 26 de fevereiro de 2011

Onde mora o pecado?

Foram apenas cinco dias na praia. Entre sol e chuva, retornaram com aquela cor de mandiopã frito. Só a mulher e os dois filhos. O pai, por extrema dedicação ao trabalho, permanecera em casa – com aquele branco azedo típico de quem compensa a frustração com cerveja e televisão em excesso. O choque epidérmico foi inevitável. Acharam que ele estava doente. “Viu? Ficou aqui, longe da família, sem alimentar-se direito e agora está aí, com essa cara de cachorro sarnento”, lascou a patroa, sem piedade, abraçada ao fofo e saudoso cachorrinho. Resmungou, porque é da natureza dele a rabugice, “Sol demais provoca danos irreversíveis a pele. Aliás, pensei que estivessem com saudades. Mas tudo bem, apesar de ter trabalhado o dia inteiro, vai ter churrasco.”

A gurizada, pouca atenção deu aos queixumes paternos. Estavam habituados, assim como já sabiam que os coroas se implicavam muito, mas se divertiam mais na hora de fazer as pazes. O resto eram carências mal-resolvidas que o tempo, forçosamente cicatriza. Mesmo assim, tivera mais um veraneio sem a família.

Os amigos maldosos diziam que ele planejava cair na noite. E lembravam aquele filme antigo, o “Pecado Mora ao Lado”, de 1955, do genial diretor Billy Wilder, que conta a história de Richard Sherman (Tom Ewell), um editor de livros que se sente "solteiro" quando a mulher (Evelyn Keyes) e o filho (Burch Bernard) viajam em férias. E fica cheio de idéias quando surge uma bela e sensual vizinha interpretada por Marilyn Monroe. É deste filme a famosa cena da loira platinada refrescando as bem torneadas pernas na saída de ar de um exaustor. Quem não ainda não assistiu, que alugue o DVD, por favor!

Wilder mostrava, lá nos anos 50, a fantasia recorrente no universo masculino: a volta aos tempos de solteiro. Liberdade! Sozinhos, muitos machos da espécia, transformam-se em predadores. Mas lhes faltam garras e parceiros. Todos os amigos estão enjaulados, ou melhor, casados. No segundo dia solitários, deprimem-se em casa. Abrem antigos álbus de fotos, sentem falta do cotidiano, que é repetitivo, mas agitado. E percebem que aquela rotina lhes dá uma reconfortante sensação de utilidade.

Assim, meu nada irreal personagem decidiu que no próximo ano, levará a turma a um passeio inesquecível. Seja qual for a proposta: Floripa, Balneário Pinhal ou Acapulco. Se é um bom profissional no trabalho, será igualmente um parceiro organizado para dividir compromisso e lazer. E já avisou: retornará igual a um mandiopã tostado, sabor camarão, com certeza.

OBS: Os jovens aí não sabem o que é Mandiopã? É o pai brasileiro dos salgadinhos de hoje. Lançado em 1954, no tempo em que os salgadinhos "chips" ainda não existiam, precisava ser frito – em óleo. Hoje ainda aé assim. Hoje, existem centenas de marcas, tipos e sabores. Eles vem prontos, menos engraxados, mas cheios de sódio e gordura trans. Mas ainda existe o velho mandiopã – fabricado em Limeira (SP), criação de seu Antônio Gomercindo, dono da fábrica e que não conta o segredo da receita de jeito nenhum.

2 comentários:

Léa Aragón disse...

Por que será que este teu personagem me lembra alguém que conheço???

Ari Teixeira disse...

Os seres humanos são muito parecidos em suas reações. Mas quem sabe, inadvertidamente, vesti meu personagem com característica de alguém conhecido.