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quinta-feira, 29 de abril de 2010

Outono para solteiros, casados ou...

Outono é minha estação favorita. E não é apenas a sensação térmica amena que me seduz, ou os doces aromas de chocolates quentes,  a volta dos assados, o calor do forno. Manhãs frias, tardes quentes, noites que pedem um cobertor. Existe algo a mais na troca de estações. É uma pré-disposição a misturar alegria e melancolia, a pedir vinhos mais encorpados, cervejas escuras. A exigir minutos a mais na cama na hora de levantar. Algo acontece e não tem a ver com quedas hormonais ou  pressão arterial. Sim, o tiozinho aqui está a salvo. 

Um amigo viúvo, diz que a antecipação do outono o faz lembrar o passado, com a falecida. "Era o período em que estávamos envolvidos com nós mesmos e tudo em volta parecia conspirar a favor”. Hoje tem uma namorada, mas a relação deles é tipicamente de verão. Viajam juntos, curtem praia, bares e fazem amor até cansar. E acho que ele cansa mais, do que faz. Depois, a coisa volta à rotina, como se uma barreira invisível os colasse ao cotidiano. Sozinho, percebe a movimentação do ar, dos ventos, das questões interiores, da natureza que sutilmente se transforma.

Outono e especialmente o inverno,  exigem um pouco mais de todos nós. Assim como o corpo pede rações calóricas, o espírito também precisa de um bom cobertor, de um sopão aromático onde a essência que lhe dará tempero será a energia acumulada nos anteriores dias onde a luz era farta. 

Outra amiga, me segreda que sonha em ter alguém com carinho e afeto quentes. Mas antes disso, reconhece, precisa mover as resistências geladas que a abraçam. Os medos, a perda do espaço. Mas o outono é mais leve justamente para ajudar nessa troca, digamos assim, de folhagem existencial e quem sabe,  liberar os
empedernidos a essa busca.

É bom ter alguém para aquecer. Não importa a motivação: amor, identidade ou interesse simplesmente. Não é esse o outono que você idealiza caro solteiro convicto? Um bom e macio cobertor, livros, revistas e uma seleção de filmes não-depressivos, ajudam muito. Um jantar quentinho com os amigos. Um chá com a mãe domingo à tarde e uma fatia daquela torta, receita antiga da família. É outono puro. 

É uma época linda para se observar os campos, paisagens urbanas. O tom amarelo-dourado das folhas, ilustram instantâneos magníficos. Lembro meu pai, na sacada, logo após o almoço. Permanecia ali, atento, emoldurando pensamentos bons e retornando alguns minutos depois para o interior da casa, sempre com seu melhor sorriso outonal.

No verão, é diferente, você quer se integrar à paisagem. Assumir os tons criados pelo sol. No inverno, a chuva e a geada nos obrigam a cerrar o olhar e as cortinas, Observamos a vida através das janelas. Muitas vezes a tristeza aperta. A primavera é linda, mas ligeira. Aqui no Sul, chove muito e lá se vão as flores e as cores vivas. A primavera é perfeita demais para garantir-se a eternidade.

Aproveitemos então, neste outono, as memórias sem dor, os projetos sem prazo, os dias amenos e a brisa que varre a estética bonita das folhas secas. Vamos fingir que reinventar a vida é simples. Que conseguiremos decifrar o que ainda nos angustia e que, examinado a fundo, com todo o rigor, não deve ter a menor importância. 

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